domingo, 9 de dezembro de 2007

Equação

Considere-se a função f(x) = 1/x! , sendo x um número natural. Se x designar a variável "tempo, em dias, entre a elaboração de um plano e a concretização do mesmo", então f designa a função "probabilidade de o plano correr conforme previsto". À confirmação por qualquer desentendido em álgebra não-linear ou outras ciências ocultas.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Balas de borracha

"Isso não magoa nada!" disse o tolo antes de ser atingido. O pobre infeliz ainda hoje uiva de dor.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Axioma

A melhor maneira de magoar alguém é dizer sempre a verdade.

sábado, 14 de julho de 2007

Cinzento

Amorfo. Insípido. Monótono. Mortiço. Sem limites definidos. Sem certezas. Sem sal. Sem pau nem pedra. Sem sentido? Talvez o tenha, mas esbatido sob aquela luz baça de quem olha através de vidro fosco. Não chega a ser tudo nem se presta a ser nada. Não é preto. Não é branco. É apenas...cinzento.

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Náufrago

Algures num qualquer oceano desconhecido, um veleiro flutua à deriva. Comigo ao leme, já deveria saber que não iria longe. Há muito que a minha bússola deixou de apontar para Norte. Não sei onde estou, só sei que não era aqui que queria estar. Ainda me lembro de quando zarpei: as cartas estudadas, os cálculos feitos, as correntes escolhidas, a rota traçada. Como sempre, de nada valeu fazer planos antecipados. De nada serviram mapas e sextantes. Sem rumo nem destino, navego agora ao sabor dos ventos e marés. Move-me apenas a certeza de que nada mais tenho a perder. A Terra é redonda e o mar é finito. A alguma ilha devo ir parar.

terça-feira, 5 de junho de 2007

Caracol

Lembro-me de uma adivinha já antiga sobre um caracol que tentava sair de dentro de um poço. Deslizando pacientemente, conseguia a muito custo subir 2 metros cada dia. Durante a noite adormecia e escorregava 1 metro para baixo. Fantástico! Metade do árduo trabalho de um dia inteiro perde-se durante a noite sem esforço adicional. O desafio consistia em calcular quanto tempo o dedicado animal levaria a sair do poço, mas isso agora nem sequer interessa. Eu não quero saber de horários nem calendários. Eu só queria chegar lá acima. Se ao menos esta concha não pesasse tanto...

terça-feira, 22 de maio de 2007

Revelação

A vida é uma doença incurável de transmissão sexual.

terça-feira, 15 de maio de 2007

Indefinição

Será? Será que é agora? Não, ainda não é. Não deve tardar, aguarda mais um pouco. E agora? Agora tem de ser...Pois, mas também ainda não é. Espera, espera, agora é que é! Também não...Mas parecia. Parecia mesmo. Tem só mais um pouco de paciência. Olha, é agora. De certeza? Sim, sim, é agora! Ah, afinal não...Bom, parece que já não vai ser hoje....

quarta-feira, 9 de maio de 2007

Trapézio

Sentir é estar agarrado a um trapézio. Uma pequena barra de madeira suspensa por dois finos cabos a 20 metros do chão. Pensar é uma faca de dois gumes. É a rede que ampara a queda e o espartilho que prende os movimentos. Pensar dá-me a segurança para enfrentar a vertigem, mas impede-me de levitar. Não, não quero pensar. Um acrobata quer-se livre para voar. Se por baixo não tiver rede, então terei de me agarrar com mais força.

quinta-feira, 3 de maio de 2007

Estrela polar

Na noite fria e escura, há algo que quebra o asfixiante negrume. Ao longe, bem lá ao longe, uma pequena luz brilha timidamente, como que pedindo desculpa por ali estar. Tanta humildade para um propósito tão nobre: guiar os perdidos, mostrar-lhes que no meio das trevas ainda há salvação. Quando a escuridão desaba, quando o nevoeiro se adensa, quando me perco sozinho no pântano da minha existência, olho para ela e sei o caminho.

sábado, 21 de abril de 2007

Deixa

Não, não forces mais. Não vale a pena. Estás a cansar-te inutilmente. Desengana-te, por muito doce que seja a tua ilusão. Não insistas. O comboio já partiu e tu perdeste-o. Poupa as tuas forças. Deixa ir. Não corras atrás de algo que já não consegues alcançar.

sábado, 14 de abril de 2007

Anjo da guarda

Sempre tive mais queda para guardar do que para ser guardado. Fui sempre aquele que apoiava, aconselhava, partilhava risos e limpava lágrimas...mas de fora. Abdiquei várias vezes de sorrir para que alguém especial o pudesse fazer. E sei que por causa disso várias pessoas nunca chegaram a saber a importância que tinham para mim. Agora chega! Estou cansado de ser anjo da guarda. Basta de fingir que me contento em fazer a felicidade dos outros à custa da minha. Alguém que me corte estas asas! Os anjos não têm sexo e não é isso que quero para mim.

segunda-feira, 9 de abril de 2007

Regresso

É bom tornar ao mundo e ver que está tudo na mesma.

terça-feira, 20 de março de 2007

Cortina de ferro

À hora marcada as cortinas abrem-se e o espectáculo começa. Uma grandiosa mostra de luz e cor. O som da música mistura-se com o das gargalhadas do público. Um rodopiante e vertiginoso turbilhão para os sentidos. Aqui não há espaço para as lágrimas. Ser triste é ser fraco e a fraqueza é a morte do artista. À frente de tanta gente é impensável claudicar sob o calor dos holofotes. Até ao final, é proibido dar à plateia razões para apontar o dedo. À hora marcada o espectáculo termina. As cortinas fecham-se. E volto de novo a ser eu.

quinta-feira, 15 de março de 2007

Diamantes

Pequenos e cristalinos, límpidos como a água mais pura. Não têm segredos, são transparentes e verdadeiros. Na sua austeridade geométrica são elegantemente graciosos. Já houve quem matasse por eles. O espírito torpe não é capaz de distinguir diamantes genuínos de vulgares cacos de vidro. Pisa-os e eles não partem. Por isso abandona-os à sua sorte numa rua qualquer. Mais tarde haverá alguém que, atraído por aquele brilho invulgar, os levará e tomará como seus, enquanto o outro que os desdenhou pode apenas recordar com saudade como lhe ficavam tão bem.

segunda-feira, 5 de março de 2007

TNT

O rastilho sempre foi curto. Sempre foi fácil de acender e muito difícil de apagar. A mais inocente faísca é capaz de colocar em marcha a contagem decrescente. Sempre foi curto, mas parece que cada vez tem vindo a encurtar mais. Como se o ar envolvente fosse corrosivo e o comesse aos poucos. Até hoje tem-se conseguido apagá-lo a tempo. Até hoje tem sido possível evitar males maiores. Mas um dia, quando ele acender, já não vai poder ser parado. De tão curto, não vai haver tempo. Um dia vão andar a apanhar pedaços de mim espalhados pelo chão.

terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

Ópio

Homem, animal de vícios. Vítima do cativeiro na sua própria satisfação. Comodista e acomodado. Masturbar o espírito até já não saber viver senão em êxtase. No dia seguinte, a ressaca. A sensação de perda, de falta. O que houve e já não há. Da euforia ao desespero, a mente delira e alucina; o corpo rói-se por dentro, as entranhas revolvem-se, revoltam-se contra a clausura. É preciso outra droga, metadona para a alma. Que neste estado de coisas, uma overdose era um mal menor.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

100 palavras

Parecem nunca chegar, mas muitas vezes são o suficiente. As boas acções valem bem mais do que as palavras bonitas, mas basta uma palavra mal medida para contaminar uma boa acção. As palavras só têm valor como arma de arremesso. Só têm força quando ferem. De resto, nem se dá por elas. São demasiado leves para construir seja o que for, mas suficientemente letais para destruir qualquer coisa. Para sarar uma ferida, todas as palavras do mundo não chegariam, mas basta uma para abrir um golpe que nunca mais irá fechar. É abismal e tão injusta a parcialidade das palavras.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Castelo de cartas

Primeiro coloco duas, apoiadas uma na outra. Ao lado outras duas, da mesma maneira. Mais três pares e o primeiro nível fica completo. Por cima construo outro, semelhante mas um pouco mais pequeno, que vai ficar por baixo de um terceiro. E o castelo vai crescendo. Vai ficando mais forte e mais sólido. À prova de fogo, à prova de água. A minha criação enche-me de orgulho. Pela janela aberta sopra uma brisa mais forte. O meu castelo de sonhos, resistente à dor e à mágoa, jaz agora numa pilha de ilusões desfeitas. Podia começar tudo de novo, mas não quero. Dá muito trabalho para o que custa vê-lo cair.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Everybody lies... *

E para contornar esse pequeno grande obstáculo, o Homem inventou o papel.

* Gregory House, MD

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

Filho pródigo

Quantas vezes não quis largar tudo e ir para longe? Quantas vezes não quis saber de nada nem ninguém? Quantas vezes não desejei desaparecer da vista de todos e até da minha também? Quantas vezes não parti, mesmo sem destino traçado, apenas para não ficar? E quantas vezes não dei por mim, a meio do caminho, inconscientemente, a voltar para trás?

terça-feira, 23 de janeiro de 2007

Antítese

Tudo é contrário. Tudo é antítese. Querer-te e rejeitar-te. Precisar de ti e afastar-te. Ouvir-te sem te escutar. Olhar para ti sem te ver. Conhecer-te e não saber quem és. Ansiar por um "olá" e responder com um "adeus". Desprezar-te por te invejar. Mandar-te à merda com um beijo. Deixar de viver ou deixar-te morrer. Se não consigo partir-me em dois, o melhor mesmo é implodir.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

Espelhos

O mundo mais não é do que um jogo de espelhos. Cada vez mais me tenho vindo a convencer de que pouco ou nada da nossa personalidade é inteiramente nosso. Pensamentos, emoções, valores, tudo é moldado pelo mundo que nos rodeia. Desde a família, aos amigos, às pessoas com quem contactamos e que nos marcam, às coisas que vemos no dia-a-dia, às boas e más experiências, tudo são pequenos pedaços de vidro com que vamos construíndo a nossa maneira de ser. Somos autênticos espelhos da realidade envolvente, que a qualquer momento podem ser quebrados em cacos e começados de novo. Da mesma maneira, quando olhamos em volta conseguimos ver a pequena parte desse jogo de espelhos que foi feita por nós. Não raras vezes a imagem que temos de nós próprios é errónea. É quando olhamos para o nosso reflexo em todos esses espelhos que nos vemos verdadeiramente. Não admira que seja tanta a curiosidade em saber que imagem produzem dois espelhos colocados frente a frente.

domingo, 14 de janeiro de 2007

Teimosia

Até hoje tenho praticado com orgulho a máxima "antes quebrar que torcer". Porém, parece-me agora que vou ter de a abandonar. A ver se quebro menos vezes.

sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

Tarot

Os videntes, entenda-se "pessoas que prevêem (ou dizem prever) o que por todos é imprevisível; que conhecem (ou dizem conhecer) o que todos desconhecem", são das coisas que mais me divertem. Principalmente quando o visado sou eu. Dá-me um tremendo gozo ver alguém a tentar fazer uma espécie de tarot mental sobre mim. A deitar-se a adivinhar o que estou a pensar, a sentir ou sobre o que estou a falar. E a convicção com que avaliam e dissecam (no fundo, tudo não passa de especulação) cada palavra, cada gesto, cada sorriso e cada esgar como cartas de um baralho com um significado determinado à partida. Nunca confiei nas cartas para conhecer o futuro. Porque hei de confiar nelas para me conhecer a mim?

segunda-feira, 8 de janeiro de 2007

Diagnóstico diferencial


I only make jokes to distract myself from the truth

Zero 7 - Distractions

sábado, 6 de janeiro de 2007

Montanha-russa

Já tantas vezes andei na maior montanha-russa do Universo e ainda não aprendi. Que as descidas são sempre a pique e as subidas sempre a custo. Nem que o momento em que tudo parece mágico visto lá de cima dura tanto como a queda vertiginosa que se lhe segue. Mas acima de tudo, ainda não aprendi que ela só anda para a frente, nunca para trás. O aço forte de que é feita impede que a tornemos diferente. Pois hei-de andar nela até à exaustão. Até saber de cor, a cada instante, o que vem a seguir. Mais uma volta?

quarta-feira, 3 de janeiro de 2007

A minha pior decisão...

...foi ter desistido de desistir.