terça-feira, 20 de março de 2007

Cortina de ferro

À hora marcada as cortinas abrem-se e o espectáculo começa. Uma grandiosa mostra de luz e cor. O som da música mistura-se com o das gargalhadas do público. Um rodopiante e vertiginoso turbilhão para os sentidos. Aqui não há espaço para as lágrimas. Ser triste é ser fraco e a fraqueza é a morte do artista. À frente de tanta gente é impensável claudicar sob o calor dos holofotes. Até ao final, é proibido dar à plateia razões para apontar o dedo. À hora marcada o espectáculo termina. As cortinas fecham-se. E volto de novo a ser eu.

quinta-feira, 15 de março de 2007

Diamantes

Pequenos e cristalinos, límpidos como a água mais pura. Não têm segredos, são transparentes e verdadeiros. Na sua austeridade geométrica são elegantemente graciosos. Já houve quem matasse por eles. O espírito torpe não é capaz de distinguir diamantes genuínos de vulgares cacos de vidro. Pisa-os e eles não partem. Por isso abandona-os à sua sorte numa rua qualquer. Mais tarde haverá alguém que, atraído por aquele brilho invulgar, os levará e tomará como seus, enquanto o outro que os desdenhou pode apenas recordar com saudade como lhe ficavam tão bem.

segunda-feira, 5 de março de 2007

TNT

O rastilho sempre foi curto. Sempre foi fácil de acender e muito difícil de apagar. A mais inocente faísca é capaz de colocar em marcha a contagem decrescente. Sempre foi curto, mas parece que cada vez tem vindo a encurtar mais. Como se o ar envolvente fosse corrosivo e o comesse aos poucos. Até hoje tem-se conseguido apagá-lo a tempo. Até hoje tem sido possível evitar males maiores. Mas um dia, quando ele acender, já não vai poder ser parado. De tão curto, não vai haver tempo. Um dia vão andar a apanhar pedaços de mim espalhados pelo chão.